Tessitura
Na pele, melhor papel
A palavra é esmerilada
Livre do peso bruto da pedra
Tem outro viço, sentido de água
Fecho os olhos suave[mente]
Tacteio as folhas leve[mente]
onde insularizam meus dedos
uma sede de incendiados mares
Viajo na textura da pele - arrepio Arde-me uma auréola de nume
Em meu pélago de rubros absintos
Fecho o livro vaga[mente]
Resta-me o acto em que me completo
Impulso de asa, simples vaga-lume
Amaranto
Murmúrios floridos de aura macia
abrem-se à volúpia de ser do instante
As mãos desfiam as heras do tempo
e os olhos velam o precipício das águas
Maviosas vertigens de cristal vermelho
escuto-lhes o silêncio, inteiro
ou não fosse o respirar a invasão do céu
e o suspiro o terramoto das verdades mais íntimas
Toco o movimento subtil das palavras e dos sentidos
e os contornos silábicos dos esboços Nocturno ardor em bocas de aurora Como seiva escorrendo pelas pétalas das açucenas
Bebo os silfos das folhas quentes de perfumes Brilha súbita centelha
Desponta o sol numa asa vermelha
Sensório
No seio onde o desejo estua
Adentro-me…
No cálice, a gota de sangue
Lúbrica valsando no leito de vidro
No meio da noite emplumada
A língua sibilina seduzindo o intento
Os lábios que os lábios acariciam
Desfilando vagos, procurando regatos
Abrem-se rosáceos, sedentos, molhados
E os dedos ávidos lavrando incêndios
Pintam acres sóis na pele que inflama
O desejo na respiração ofegante e plena
Em rubra labareda sulca sábios veios
Num sopro solta-se a corda dum canto
Bocas incendiadas, puros diademas
Nos gemidos da noite fecundada
Ferida a noite, treva aveludada
Em êxtase suave, quase adormecida
Silencio a chama que incandesce por dentro
Queimo o fogo com as pontas dos dedos
Outonal
Como um zéfiro na madrugada
Que passa lento na hora transviada
Dríade diáfana no adejar de asas
A céu aberto expõe meu lado de dentro
Junto às aras do clarão dos círios
E como que ouvindo a música dolente
Destece a chuva e seus cabelos de frio
E colhe o lírio da inocência perdida
Bocas de rio afagam o gozo da terra em cio
Prendem-me em tranças a meia lua
Enrolam-me em neblinas semi nua
Diluo meu corpo em meio do murtal virente
Gotas de orvalho sob o mistral da finitude
Pousam no sideral da incomplenitude
Incandescentia
Quando a noite cai e o vento sopra
A pele em poesia desabrocha
Mergulha lenta em desvarios
Delineia no corpo versos de arrepios
E se o vento sopra sussurrante
A pele ansiosa espera suplicante
O toque redutor da carícia felina
Que inebria o corpo da poesia
Um fogo serpenteia faminto
A boca humedece a voz num grito
A pele se rende à volúpia fluindo
E como um vulcão pedindo vazão
Lânguida geme e a lava derrama
Sangrando a brancura da inspiração