segunda-feira, junho 28, 2010

Arrebol













Ventos supernos nos ombros do tempo
Um salmo prelúdio se agita
Escuto o murmúrio virente do desfolhar das grinaldas
Tranço folhas na boca da fonte
Santelmo aceso em maviosos flancos
Queimam-se incensos no clarão dos círios
Nas ciliciadas carnes, rútilo sacrário
pomos sazonados de carmim vivo emergem
A flor o cálice inclina
Turíbulo de prata que a sede abrasa
Profundo anelo no esflorecer das vinhas, volatas
Luxúria aveludada num torpor de coma
Uma flor ceifada em vasos de água

domingo, junho 13, 2010

Arpeggio















Oram os arcanos que habitam a paisagem de dentro.
Mais que um cio de estação
um afrodisíaco desejo de tactear a flora que me aflora,
senti-la soluçar em fervida espadana.
Carnívora bromélia de luxúria da boca que silencia
a polpa da púrpura do sangue que me incendeia.
A quimica das línguas.
Entre lábios o gosto das frutas maduras perfumando a íris do hálito.
Deixar que as asas de ave que me ofertam as pontas dos dedos
me adentrem a nudez imperiosa e quente
e a pelúcia das mãos tinjam de vermelho
o delubro do corpo que se faz vinho madurado.
Tocam-se as margens da verbe que vibra em suaves arpejos.
Alçada vertigem que insurge latejante .
Húmida feito húmus deixo que pernoite em meu lençol de prata
e fecunde os corpos abertos em árvore
enigmas que almejam ser decifrados

terça-feira, setembro 09, 2008

Corpografia


















Sei de um tratado em papiro
Guardado no berço luzente do peito
Teço meus rios
Paralelos com outros rios
São instantes maduros de nascente
Exalados na brisa, no pêndulo do vento
Aceso olfacto nas pontas dos dedos
Concebidos em gestos, mãos silentes
Não sei se é linguagem
Essa valsa de hemácias
Cuja boca penetra a voz
E me acaricia com seus lábios de vinho
Arqueia-se o sol, ícone em rubro
A morte sobe pelos dedos
Desfaz-se em embriaguez
Tornando mais fogo a sede de dilúvio

sábado, agosto 30, 2008

(...)


















Deixo que as mãos pousem em orvalho
O corpo inteiro decantando o movimento
deixa-se cair sobre uma serafina silenciosa
que com a sua língua escarlate
abrasa as palavras
e as queima antes de serem

Mesmo que a luz se apague
Um dia talvez
O torso lembrando o respirar da vela
inflame as varandas por dentro viradas ao centro
A noite possa ter portas e o silêncio encontre
o seu bronze num poente em brasa
Os dedos teçam a voz que me fecunde o ventre
E o fósforo dos olhos esverdeie
enquanto as pálpebras bebendo de um só trago
me devolvem os sonhos que rebentam como brotos
e serenamente se abrem em floradas

Foto de Luís Mendonça

segunda-feira, abril 07, 2008

In_verso


















Escrevo na parede de dentro da escrita
As mãos avolumando o seio da folha em branco
Uma fala alumbrada na tinta que me veste os dedos
Soletra a palavra acesa que na fuga se faz ave
Falena palpando uma música que poreja
Amásia que me aplaca o fogo das asas

sexta-feira, abril 04, 2008

Pérgula


















Beber da pálpebra dos lábios
Uma fala livre, canoeira da língua que nos devolva tudo
Percorrer as calçadas do bordado
O braço das raízes moldando o orvalho à soleira do jardim
Chegar ao ponto alto
Onde as polpas dos dedos procriam a ramagem do vento
E as cachoeiras deslizam na planura das boninas
Colher o álacre do hálito na pele em brasa
Declive onde o corpo se abisma

domingo, março 23, 2008

Colirium


















Coloca uma palavra
No vale da minha nudez
E planta vinhas de sol de ambos os lados
Para que quando a brasa for alfombra
Minha boca fique toda à sombra
E se torne carícia o fogo do astro